Viragem
Marcelo Amorim
Massapê
26 de agosto a
02 de setembro de 2023
english below
Viragem
Na sala escura, o olhar demora a se acostumar com o breu. A única luz acesa é vermelha e é fraca o suficiente para identificar apenas os gestos entre o ampliador e as bacias dos químicos que revelam, limpam e fixam imagens. Os breves lampejos de luz branca projetam no papel fotográfico antes envermelhecido pela luminosidade filtrada. A imagem que se forma surge aos poucos em contato com o revelador, então é lavada em água e colocada novamente em outra solução que a torna permanente. O cheiro forte de amônia preenche o ambiente.
Já foi dito que a fotografia deveria permanecer sem cor, uma vez que esta seria do domínio da pintura, que as nuances de cinza eram suficientes para dar profundidade ao instante que prende o tempo no cristal de prata. Tal afirmação tem um pouco de pretensão, um outro tanto de medo e até mesmo uma certa tecnicidade sobre uma tecnologia que ainda privilegiava os negativos preto e branco aos coloridos, mas principalmente tenta dar a fotografia também uma certa especificidade, talvez a colocando em lugar onde o que se dizia específico da pintura não alcançava.
A Viragem, na fotografia, se refere ao processo de recolorização de cópias preto e branco através do uso de certos químicos. O uso de ferro no processo torna os pretos em tons de azul, o potássio e o enxofre em tons sépia, o urânio em verdes e, por fim, o cobre em vermelhos – do mais rosado ao carmim.
Em Viragem, Marcelo Amorim transforma cartões postais da paisagem do Rio de Janeiro – natureza metonímia testemunha de um Brazil – em pinturas que exploram na cor e no gesto um processo de redescobrimento. Um redescobrimento que se propõe a vislumbrar essa paisagem, busca desvendar na pintura os processos de envelhecimento da própria fotografia – como o sal de prata segura o tempo através do tempo, como isso transforma a cor.
Antes de tudo, Marcelo é um arquivista. Coleciona, edita e diagrama imagens em seu ateliê, em procedimentos que envolvem a colagem, o design, a serigrafia e a pintura. Nesse processo, o artista opera uma forma de pós-produção que re-mediatiza essas imagens, passando a imagem de um estado a outro. A própria montagem desta exposição é um indício desse processo. Montadas com o horizonte contínuo, as obras desvelam, com enquadramento de cada fotografia virada em pintura, tanto as similaridades entre cada paisagem, como as diferenças de cada fatura. Com o tempo, o olho no laboratório se acostuma com a luz vermelha e é possível diferenciar suas matizes. Aqui, na sala de exposição, cada vez mais é possível perceber também essas diferenças.
O que resulta não é uma pintura-de-fotografia, é algo além. Se coloca em suspensão o que é próprio de cada medium. As pinturas de Marcelo Amorim são viragens à óleo. O processo, antes químico e laboratorial, é agora praticado pelo gesto do artista, que reinforma a pintura de paisagem a partir de uma fotografia já informada por outras paisagens pintadas: uma alquimia.
Turning
Marcelo Amorim
Massapê
August 26th to
September 30th 2023At the darkroom, the sight take some time to get used to the darkness. The only light source is red and it's weak enought to only identify the gesture between the amplifyer and the trays that holds the chemicals that develop, clean and fix images. The fast flashes of white light project on photographyc paper before redened by the safelight filters. The image slowly emerge by the contact with the developer, and then it's washed and put on another chemical that makes it permanent. The strong smell of amonia fill the room.
It was once said that photography shoud remain colorless, since color would be specific to painting, that the gray grading were enough to give depth to the instant held in time by the silver crystal. Such saying is at the same time quite pretentious, quite coward and even quite technical over a tecnology that still valued more black and white negatives over color, but it mainly try to give photography some kind of specificity, maybe putting it someplace where what was said specific to painting couldn't reach.
The photography Turning refers to the process of recoloring black and white copies throught the use of certain chemicals. The use of iron in the proccess turn the blacks into hues of blue, the potassium and sulfur into sepia, the urane into green and, lastly, copper into red – from the pinkiest to carmin.
In Turning, Marcelo Amorin tranforms postcards of Rio de Janeiros's landscape – a witness metonymy of Brazilian nature – into paintings that explore on color and gesture a proccess of rediscovery. A rediscovery that propose itself to glimpse this landscape, try to unravel on painting the processes of aging of photography itself – how the silver crystal holds the time throught time, how it transforms color.
First of all, Marcelo is an archivist. He collects, edit and diagram images in his studio, in procedures that involves collage, design, printmaking and painting. In this proccess, the artist works in a post-production way that re-mediatize the images, turning it from state to another. The expography of this exhibition itself is a clue to this aproach. Exhibited with a continuous horizont, the paintings unvail, by the framing of each photography turned painting, both similarities between each landscape as the differences in the gesture of each painting.
As the time goes by, the eye get used to the red light and it's possible to perceive it's nuances. Here, on the exhibition room, it gets more and more easier to also notice the differences. What results is not a painting-of-a-photography, it's something else. What is specific of each medium gets suspended. Marcelo Amorim's painting are Oil Turnings. The once chemical and laboratory procedure is now practiced by the artist's gesture, which reinforme the landscape painting from photography once informed by other painted landscapes: an alchemy.