Bruno Ferreira e
Marc do Nascimento
25M
2022
english below soon
Bruno especula sobre um futuro pré-humano: as culturas de bactérias que formaram a atmosfera são profecias de que o fim não é a única saída. Em "Vale da Estranheza", a paisagem-pélvis artificial se propõe a abrigar uma espécie de proto-sopa-primordial, onde a atmosfera propícia à vida teria sido criada. O termo que dá título ao trabalho se refere a uma teoria estética que relaciona a resposta emocional que temos à humanização de objetos tecnológicos. O "Vale da Estranheza" seria expresso, graficamente, no momento em que a semelhança deixa de ser positiva e passa a trazer desconforto. A paisagem, aqui de gesso, resina e água, é tanto a representação gráfica desses dados quanto objeto. A vida, expressa no Scoby - gosma simbiótica de fungos e bactérias - se posiciona no centro desse vale, talvez sem conseguir entender a inogarnicidade dos materiais que a circundam.
Esse vale-objeto-gráfico de Bruno Ferreira poderia também estar manifesto em mapa topográfico, tal qual o pico do Jaraguá se mostra no trabalho de Marc do Nascimento. O desenho-dado da instalação "Montanha pulverizada para John Mawe 2 (da série Terra Incógnita)" é paisagem-interface que interpreta os dados de altitude do relevo do monumento que, em outros tempos, se destacava no horizonte de São Paulo. O desenho topográfico se esforça para demonstrar uma imparcialidade, mas esconde por entre as camadas das linhas de altitude que o pico do Jaraguá certa vez foi apenas montanha, outra foi sinônimo de mineração de ouro e hoje abriga torres de transmissão de TV. Há sempre algo que permanece, ainda quando o sentido seja alterado e, mesmo na procura por algo duradouro, é difícil encontrar uma constante. Através da interface dos dados, da digitalização dessa ficção do que é-foi-será o Pico do Jaraguá, Marc elabora uma imagem que chama de espectral, atravessada pela interface técnica dos softwares.
Não há como deixar de pensar sobre futuro e sobre como vivenciaremos esse futuro. É inegavel que vivemos o antropoceno, era da marca irreparável da presença humana na terra. O que há de restar aqui depois de nós? As bactérias, fungos e montanhas já nos antecederam e irão nos suceder. Será que o prolongamento dos polegares opositores, catalizados pelo uso dos dispositivos móveis, nos ajudará a sobreviver? Os dados que inventamos, catalogamos e carregamos em databases sobre tudo, dão conta de representar o mundo? Essas não são perguntas para as quais se tenham respostas definitivas, podemos apenas teorizar e elaborar futuros distantes que serão vivenciados apenas pelo o quê sobreviver. Até lá, sigo tomando smoothies tingidos de azul e verde pela Espirulina, na promessa de saúde e conexão com a bactéria que um dia ajudou a formar a vida.